A
maioria das estrelas do cinema ficou em silêncio até agora, após o massacre de
20 crianças e seis adultos em uma escola de Connecticut. Especialistas em
cultura pop dizem que não é difícil entender por quê. “Quando você é uma
estrela conhecida por carregar armas e atirar, quando acontece algo assim a
última coisa que você quer é se colocar no centro da discussão... a não ser que
pretenda nunca mais estrelar um filme de ação ou aventura”, propõe Robert Thompson,
professor de cultura popular na Universidade Syracuse. Defensores de longa data
do controle de armas, como a atriz Susan Sarandon e o diretor Michael Moore,
logo fizeram seus comentários e milhares de americanos assinaram petições
pedindo maiores restrições ao porte de armas.
Ainda
assim, heróis de ação como Arnold Schwarzenegger, Bruce Willis, Denzel
Washington, assim como Pitt e Clooney, nada disseram. Mas isso pode mudar, de
acordo com um veterano profissional de relações públicas com muitos clientes em
Hollywood. “Acho que haverá uma demonstração pública de insatisfação vinda de
pessoas importantes do mundo do entretenimento querendo fazer algo em relação a
armas”, disse ele. “Acho que o estereótipo da estrela de ação evitando esse
assunto está datado. Há muitas pessoas conversando sobre a necessidade de
expressar sua revolta. Vamos ver como isso vai se manifestar.”
Com
os estúdios novamente enfrentando críticas por produzirem filmes violentos, a
Paramount Pictures cancelou no sábado a premiere de “Jack Reacher”, novo filme
de Tom Cruise [foto acima], no qual o galã interpreta um ex-militar de sangue
frio. Em Nova York, o Lincoln Center adiou uma exibição do filme, que teria a
presença de Cruise, por “respeito pelas famílias que perderam entes queridos em
Newtown, Connecticut”.
“Jack
Reacher” começa com um atirador de elite atirando em cinco pessoas
aparentemente normais. O filme tem estreia marcada nos EUA para a próxima
sexta. Cruise nada disse sobre o atentado em Connecticut e não comentou o assunto
durante uma entrevista no “Late Show With David Letterman”, na segunda-feira.
Mas o diretor de “Jack Reacher”, Christopher McQuarrie, afirmou que o ator teve
papel decisivo no cancelamento da premiere em Pittsburgh, onde o filme foi
rodado.
“Nós
dois insistimos. Ninguém deveria celebrar nada 24 horas depois de um evento
trágico como aquele”, disse McQuarrie ao site TheWrap.
Letterman,
por outro lado, falou longamente sobre as mortes antes de Cruise entrar no
palco do programa. O apresentador sugeriu que legislação mais dura sobre armas
não era a resposta para um programa social “multifacetado”. “Não sou bobo o
bastante para pensar que esse é um problema de armas, pois antes de elas
existirem as pessoas já se matavam”, disse Letterman.
Ele
se disse estupefato pela “necessidade” de as pessoas portarem armas
semiautomáticas, como uma das usadas no massacre. Num tom mais leve, comentou:
“Nunca vi um cervo que mereça 30 cartuchos de munição de um rifle automático.”
Na
televisão, a Fox tirou do ar trailers
mais fortes da série “The following”, sobre um serial killer, e modificou episódios dos desenhos “Family Guy” e “American
Dad”, para evitar qualquer “conteúdo potencialmente sensível”. O último
episódio da premiada série “Homeland” – que inclui a explosão de um carro-bomba
– foi precedida por um alerta de que algumas cenas poderiam ser perturbadoras.
Hollywood
normalmente reage mal quando filmes ou videogames são culpados pelas ações de
cidadãos americanos, alguns deles com problemas mentais, que causam tragédias
com armas. “Acho que é sempre injusto colocar a culpa na indústria do
entretenimento. Existe algo na psique americana muito mais profundo que
videogames, filmes ou músicas”, avalia o profissional de relações públicas.
Apesar
do atentado que deixou 12 mortos e 59 feridos no Colorado, durante uma exibição
de “O cavaleiro das trevas ressurge”, em julho, o filme fez mais de US$ 1
bilhão nas bilheterias mundiais, se tornando o segundo mais rentável do ano nos
EUA.
Na
Universidade de Syracuse, Thompson questiona quanta influência celebridades têm
quando expressam suas opiniões pessoais, especialmente num tema como controle
de armas, que levanta tantas paixões nos EUA.
“É
mais provável que esse tipo de discurso leve as pessoas a mudarem suas opiniões
quanto à celebridade, não à causa”, argumenta.
(O Globo)