domingo, maio 04, 2008

Operação Cavalo de Tróia

“Muitas pessoas, após a leitura dos anteriores Operação Cavalo de Tróia, me formulam a mesma pergunta: ‘Mas é verdade? Tudo isto é crível?’ E eu me vejo obrigado a repetir a única coisa que sei: que esses documentos existem e que – ainda que alguns se empenhem em pensar o contrário – eu não possuo tanta imaginação. Desafio quem quer que o deseje a construir uma ‘vida de Cristo’ tão rica de lógica, audácia e beleza. Não é tão simples ‘inventar’ discursos de Jesus de Nazaré – práticas inéditas e, o que é mais interessante, cheias de sabedoria – ou esses trinta e dois anos que os crentes designam como ‘vida oculta’. ‘Inventá-los’, claro, com dados, nomes, acontecimentos e circunstâncias coerentes. Em Operação Cavalo deTróia, eu sei, adeja algo ‘mágico’ e ‘real’, alheio a mim mesmo. Eu não fui senão simples instrumento. Em suma, e não me cansarei de insistir nisso; é o coração do leitor que deve ‘sentir’ se estas narrações acerca de Jesus são ou não críveis. Que cada qual, portanto, no mais íntimo de seu ser, julgue e decida de acordo com os ditames de sua consciência. Essa jamais se equivoca...”

Esse texto, nem um pouco despretensioso, do autor e jornalista espanhol Juan José Benítez, encontra-se na contracapa do terceiro volume da série Operação Cavalo de Tróia (que acabou de receber seu oitavo volume). J. J. Benítez nasceu em Pamplona, em 1946. Estudou Jornalismo na Universidade de Navarra e trabalhou como repórter nos diários La Verdad, de Múrcia, e El Heraldo de Aragón, em Zaragoza. Seu interesse por temas misteriosos, “ocultos” e fascinantes surgiu ao iniciar seu trabalho na Gaceta Del Norte, em Bilbao, onde entrou em contato com o assunto dos ovnis. Em 1975 trocou a carreira de repórter pela de escritor, com a publicação de seu primeiro livro. Descobriu o rendoso filão da literatura de mistério e hoje possui dezenas de livros publicados.

Com Operação Cavalo de Tróia, best-seller mundial em oito volumes, com mais de 30 edições para o primeiro volume só na Espanha, J. J. Benítez se aventura nos fatos e acontecimentos concernentes à vida de Jesus e Sua época. Benítez insiste em ser apenas um mediador. Diz ele que um militar e cientista da Força Aérea Norte-Americana, em seu refúgio no México, no fim da vida, confiou-lhe documentos que revelam a suposta execução de uma experiência que permitiu a uma dupla de militares da Força Aérea dos Estados Unidos voltar no tempo quase dois mil anos e ser “testemunha ocular” e “participante” dos últimos dias de Jesus Cristo na Terra, desde Sua entrada em Jerusalém até Sua prisão, julgamento, crucifixão e ressurreição. Essa experiência, batizada pela Nasa de “Operação Cavalo de Tróia”, teria sido realizada sigilosamente em 1973, em pleno coração de Israel.

Os dois primeiros volumes de Operação Cavalo de Tróia relatam a viagem do major norte-americano que, a bordo de um módulo projetado pela Força Aérea, se desloca no tempo até a Palestina do ano 30, acompanhando os derradeiros onze dias da vida de Jesus antes de Sua crucifixão e as primeiras evidências de Sua ressurreição. Em Operação Cavalo de Tróia 3, o cenário é a Galiléia, região de pescadores, onde o Nazareno escolheu Seus discípulos e onde pregou e viveu muitos anos. O autor fala, inclusive, a respeito das aparições de Cristo às margens do Tiberíades. Nesse volume o major inicia um diálogo com Maria, mãe de Jesus, que culmina no volume 4, intitulado Nazareth. “Prato cheio” para as especulações do autor, pois trata dos chamados “anos ocultos” de Cristo, ou seja, de Seus 14 aos 26 anos. Por se tratar de livros com fundo científico e histórico impressionante, muitos passam a, senão acreditar, não desacreditar totalmente de sua suposta veracidade. Nos volumes seguintes da série, o enredo continua o mesmo, com mais “revelações” sobre o Filho de Deus.

O autor, para explicar o mecanismo utilizado na volta ao tempo, chega a reformular as próprias bases da física moderna. Termos técnicos e definições complicadas entremeiam o texto. Outro fator que empresta certa “seriedade” aos livros é a citação de historiadores abalizados, como Flávio Josefo, para fundamentar a explanação dos costumes e contexto histórico.

Até aqui, tudo bem. Não passa de uma série de oito volumes com a pretensão de verdadeiros, ficando a critério do leitor avaliar ou não sua credibilidade. Entretanto, o problema surge quando, ao se perscrutar suas milhares de páginas, percebem-se frases como estas: “Este fato, como outros que pouco a pouco iria descobrindo, não havia sido incluído claramente nos Evangelhos Canônicos que conhecemos”; “...não foi descrita corretamente pelos evangelistas”; “Aquele episódio, certamente, nada tinha que ver com o que se conta nos Evangelhos”; “...uma possível confusão por parte de São Mateus”; “...seria pouco menos que impossível que suas palavras [de Jesus] pudessem ser recolhidas no futuro, integralmente e com total fidelidade”; “...meus pequenos de hoje [os apóstolos] terminarão por alterar involuntariamente minha [de Jesus] mensagem...”; “...ao menos nesta parte os Evangelhos Canônicos foram pessimamente escritos. Mas, desgraçadamente, não iria ser esta a única passagem ignorada ou mal-interpretada pelos evangelistas...”

A lista poderia ser ampliada (são cerca de 50 do tipo, espalhadas só nos primeiros quatro volumes da série), mas essas afirmações já bastam para se ter uma idéia do problema. Diversas vezes o autor tenta, de forma sutil ou mesmo explícita, depreciar as Sagradas Escrituras, colocando seus escritos em nível superior aos da Bíblia. Dizer que os Evangelhos foram “pessimamente escritos” ou que houve “má interpretação pelos evangelistas”, é supor que as Escrituras foram simplesmente obra de seres humanos não inspirados. Na verdade, Benítez tenta fazer o leitor crer que nada de inspirado há na Bíblia e que seus escritores encontram-se em aberta contradição com relação à cronologia histórica e consigo mesmos. Todavia, sabemos que os cerca de 40 escritores das Escrituras, desde pastores a reis, jamais se contradisseram, pois “toda a Escritura é divinamente inspirada” (2Tm 3:16) e “a profecia nunca foi produzida por vontade de homem algum, mas os homens santos de Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo” (2Pe 1:21).

Outros “problemas” na área teológica aparecem nos diálogos do major com “Cristo”. Na página 172 do volume 1, “Jesus” responde à pergunta do militar norte-americano sobre a morte dos ímpios nos seguintes termos: “Eles se darão conta, ao deixar este mundo, de que ninguém lhes perguntará por seus crimes, riquezas, poder ou beleza.” Note que é este justamente o objetivo do inimigo de Deus: deixar os homens despreocupados com o juízo vindouro, levando uma vida impenitente até que não haja mais oportunidade de arrependimento. Na página 174 do mesmo volume, “Cristo” faz uma alusão ao evolucionismo: “...muito antes que o homem fosse capaz de erguer-se sobre si mesmo, meu Pai havia semeado a beleza e a sabedoria na Terra.” Na página 200, o major faz uma grave declaração: “...os ‘santos’, ou ‘separados’ criam que, na ressurreição, os corpos se levantavam fisicamente. E Jesus, em Suas afirmações, não Se referiu a este tipo de ressurreição...”

A Bíblia diz, sim, que seremos transformados (1Co 15:51) e passaremos a ter um corpo glorioso, mas de modo algum “espiritual” ou “etéreo”, como o autor deixa transparecer em sua obra.

Outras duas declarações, analisadas em seu mais profundo sentido, abalariam os próprios fundamentos do cristianismo: “Cada geração de crentes deve levar por diante sua obra, com vistas ao possível retorno do Filho do homem” (p. 225, vol. 1, itálico acrescentado); “...as absurdas e falsas idéias sobre o ‘retomo’ do Mestre...” (p. 324, vol. 3). Chamar a volta de Jesus de “possível” e “absurda” é pôr em dúvida a “bem-aventurada esperança” (Tt 2:13) de toda a Bíblia e de todos os cristãos sinceros em todos os tempos. No Novo Testamento, um em cada onze versículos se refere à segunda vinda pessoal, real e visível de Cristo, e em toda a Bíblia há cerca de 2.500 referências a esse grande acontecimento (veja Ap 1:7; Jo 14:2 e 3; At 1:11; Mr 13:26; Hb 9:28; ITs 4:15; Mr 8:38; Fp 3:20 e 21, etc.).

Na página 175 do segundo volume, encontramos a ideologia que permeia todos os escritos do autor: o espiritismo: “Cada uma das inúmeras moradas da Casa de meu Pai é um lugar de passagem, uma vida projetada para servir-vos de preparação para a seguinte.” Além do mais, expressões como “forças espirituais”, “entidades espirituais”, “alma imortal” e outras aparecem vez ou outra em suas obras. A Bíblia é clara neste assunto: “Aos homens está ordenado morrerem uma vez, vindo depois disso o juízo” (Hb 9:27).

No volume 3, páginas 300 e 301, o escritor usa palavras que Cristo nunca disse para deixar claro seu pensamento: “Em meu Reino há muitas moradas... e uma delas é passagem obrigatória para os mortais que procedem dos mundos evolucionários do tempo e do espaço.” “Todavia, podeis desfrutar a esperança de que ninguém, ninguém, pode perder esse direito [o da ressurreição].” É a mesma mentira original de Satanás: “Certamente não morrereis” (Gn 3:4). Quanto à salvação, veja Marcos 16:16.

Nas páginas 279 e 305 dos volumes 1 e 3, respectivamente, o autor deixa transparecer influências orientalistas em sua obra. Nas referidas páginas, Benítez, através do diálogo do major com “Cristo”, afirma que a verdade é inerente a todo ser humano, basta encontrá-la dentro de si (quanto a isso, veja Jo 14:6), terminando por sustentar que todo ser humano possui algo de Deus dentro de si, sendo, por conseguinte, também Deus (panteísmo). Típico argumento da filosofia Nova Era e totalmente antibíblico.

O fascínio do autor pelos ovnis também aparece em Operação Cavalo de Tróia. Benítez sugere que as trevas sobrenaturais que ocorreram por ocasião da morte de Cristo foram causadas por um enorme disco voador que se teria interposto entre a Terra e o Sol, bloqueando a luz solar. Também na agonia de Jesus no horto do Getsêmani, Benítez faz alusão a um objeto voador que teria ficado pairando sobre o Nazareno.

A relação de especulações e de meias e falsas verdades poderia prosseguir, mas encerro com a mais contundente e grave: “Eu [‘Jesus’] não vim ao mundo para saldar uma suposta velha conta dos homens para com Deus...”; “...toda idéia de resgate ou expiação, portanto, é incompatível com o conceito de Deus”; “Antes de eu vir a este mundo (e até mesmo se eu não tivesse vindo), todos os mortais do Reino dispunham já da salvação” (v. 3, p. 307, 308). Não creio que o autor conhecesse as reais implicações dessas asserções. Caso fosse assim, você, ele, eu, todos estaríamos sem esperança, pois nossa salvação depende da aceitação do sacrifício de Cristo na cruz; somente o precioso sangue de nosso Senhor Jesus tem o poder de salvar. Isso jamais foi e jamais será um dom inerente ao ser humano.

Não é tarefa fácil avaliar o conteúdo de oito volumes em espaço tão limitado, mas creio que o que foi exposto já é suficiente para desmistificar essa obra que por muitos é considerada real. O título Operação Cavalo de Tróia é bastante adequado quando conhecemos a história da operação original que levou esse nome. Usando um cavalo oco, guerreiros gregos romperam o cerco de Tróia. Assim trabalha Satanás. Utiliza meios aparentemente inofensivos, através dos quais semeia o erro e a mentira. Por isso devemos ter sempre em mente as palavras de Ellen G. White: “Teorias falsas serão misturadas com cada fase da experiência e defendidas com zelo satânico a fim de cativar a mente de toda a alma que não está arraigada e fundada em um conhecimento completo dos princípios sagrados da Palavra” (Manuscrito 94, 1903).

Michelson Borges, jornalista e mestrando em Teologia pelo Unasp