O que teria causado a fragmentação? |
Há
mesmo uma grande porção continental submersa no fundo do Oceano Atlântico, o
que muda as teorias aceitas até agora sobre como se deu a separação entre
América do Sul e África. Em 2011, geólogos colheram amostras de granito, um
tipo de rocha continental, da Elevação do Rio Grande, uma cadeia de montanhas
submersas a cerca de 1.300 quilômetros (km) do litoral do Rio Grande do Sul. Até
então, eles acreditavam que essas montanhas seriam resultado da formação do
assoalho oceânico e de erupções vulcânicas, portanto formadas por outro tipo de
rocha. Dois anos depois, por meio de um submarino, foram recolhidas outras
amostras de rochas típicas de formações continentais, cuja análise reforçou a
hipótese de que essa região do Atlântico Sul poderia de fato ser um pedaço de continente
que teria submergido durante a separação da América do Sul e da África,
iniciada há 120 milhões de anos [segundo a cronologia evolucionista].
A
conclusão deu valor econômico à Elevação do Rio Grande. Em julho passado, o
governo federal recebeu a autorização para levar adiante o plano de exploração
de jazidas de cobalto dessa região, situada em águas internacionais, e a
possibilidade de ali haver reservas de outros minerais, como níquel, manganês e
terras-raras tornou-se mais concreta. Cresceu também seu valor científico, por
servir de argumento adicional para a hipótese de que a separação da América do
Sul da África foi mais complicada e fascinante do que se pensava. [Quem sabe
catastrófica...]
Agora
já parece haver um consenso entre os geólogos de várias partes do mundo de que
os grandes blocos de rochas - ou microplacas, uma referência às placas
tectônicas continentais - que formam os dois continentes e o assoalho oceânico
não se afastaram como duas partes de uma folha rasgada, mas se esticaram, quebraram-se e se posicionaram caoticamente.
Algumas partes podem ter ficado no meio do caminho e afundado, enquanto outras
se afastavam e se misturavam, formando um imenso mosaico que agora se torna um
pouco mais claro.
As
rochas coletadas da Elevação do Rio Grande - granitos, granulitos, gnaises e
pegmatitos - devem ter de 500 milhões a 2,2 bilhões de anos [idem], de acordo
com as análises de equipes da Universidade de Brasília e do Serviço Geológico
do Brasil (CPRM). “As idades não estão fora do que encontramos na América do
Sul e na África”, diz Roberto Ventura Santos, da CPRM. Segundo ele, os
levantamentos sísmicos indicaram que a espessura da crosta é de cerca de 30 km
na região da Elevação Rio Grande, “típica de crosta continental e não oceânica”,
reiterando a conclusão de que se trata de um resquício de continente.
Essa
descoberta, uma das mais espetaculares da geologia brasileira dos últimos
tempos, trouxe algumas dúvidas. Pensava-se que as duas cadeias montanhosas do
Atlântico Sul, a Rio Grande e a Dorsal Atlântica, tivessem se formado na mesma
época, mas agora se cogita que pode não ter sido assim. E quais são os efeitos
da Elevação do Rio Grande? Uma cadeia com montanhas de 3.200 metros de altura
no fundo do Atlântico Sul, cujo topo está a apenas 800 metros de profundidade,
deve formar barreiras para a circulação oceânica, mas ainda não se sabe ao
certo como.
Ventura
acredita que algumas respostas podem vir à tona com a análise de uma coluna com
70 metros de sedimentos do fundo do mar, que, espera-se, permitirá a
reconstituição de fenômenos climáticos e geológicos dos últimos sete milhões de
anos [idem]. “A identificação de rochas continentais na Elevação do Rio Grande
muda o quadro da evolução do Atlântico Sul, que se formou com a separação dos
dois continentes”, comenta o geólogo Peter Christian Hackspacher, professor da
Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Rio Claro.
Há
quase 20 anos, por meio de pesquisas de campo no Sudeste e Sul do Brasil, na
Namíbia e em Angola, ele examina os sinais das possíveis forças que levaram à
separação da América do Sul e da África.
Suas
conclusões reforçam a contestação do modelo tradicional, segundo o qual as
linhas de costa dos dois continentes, representando os blocos de rochas que os
formaram, poderiam se encaixar. Há um encaixe na costa do Nordeste com o Oeste
da África, mas em outras regiões, como o litoral do Rio de Janeiro, parecem
faltar partes do quebra-cabeça de rochas.