“A graça do Senhor Jesus Cristo, e o
amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo sejam com todos vós” (2 Coríntios
13:14).
Canta-se no meio evangélico certa música cujo refrão diz o seguinte: “Ninguém explica, ninguém explica Deus. [...] Do crente ao ateu, ninguém explica Deus.” Tal reconhecimento visa a demonstrar que o ser de Deus é para a mente humana algo incognoscível, ou seja: a tentativa de entendê-Lo por pura lógica, ou mesmo com os recursos limitados da linguagem por analogia, constitui um desafio e uma impossibilidade. A inexplicabilidade de Deus não é assunto recente. Há séculos ela tem incomodado intelectos privilegiados com argúcia filosófica e teológica, como o de Santo Agostinho: “Deus é inefável; é mais fácil dizer aquilo que Ele não é do que aquilo que é. [...] Antes de conhecer Deus, achavas que eras capaz de expressá-Lo; mas agora que começaste a conhecê-Lo, percebes que não és capaz.” Prossegue o bispo de Hipona: “Por descobrir que não podes exprimir aquilo que conheces, deves, por acaso, ficar em silêncio?” Não, não se pode ficar em silêncio. Contudo, o silêncio sobre Deus só é capaz de ser quebrado pela voz da revelação.
Quando, numa palestra para acadêmicos
e universitários, conhecido teólogo brasileiro foi interrogado acerca da
natureza de Deus (se Ele é matéria, energia, força ou ideia existente na mente
humana), foi dada a resposta ao seu interlocutor: “Deus é um ser que se Ele não
Se revelar eu não posso compreendê-Lo.” Se o homem, com ferramentas mentais
próprias, não consegue construir uma explicação para a Divindade, então, dada a
Sua existência como fato, quereria Deus, por Sua iniciativa, “explicar-Se” a Si
mesmo?
Deus é mistério (Isaías 45:15), e
permanecerá assim para os seres criados por toda a eternidade. No entanto, a
misteriosidade que cerca a natureza divina não implica completa ignorância
acerca da identidade do Ente infinito. Pela via da revelação bíblica sabemos que
Deus Se apresenta de forma admirável: como Alguém todo poderoso, transcendente
e pessoal. Conforme assume o teísmo clássico, Sua personalidade ímpar, Seu
caráter justo e amoroso, Seus atributos grandiosos e atos excelsos na história
humana O tornam inigualável perante as demais concepções religiosas
concorrentes. Porém, um aspecto de Sua identidade tem sido ponto de acirrados
debates fora e, principalmente, dentro do cristianismo: Deus são três pessoas –
o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Triteísmo?
A Igreja Adventista do Sétimo Dia, em
consonância com o cristianismo histórico, assume a posição de que Deus é uma
Trindade. Entretanto, dentro do próprio círculo cristão, muitos estão fazendo
uso de hermenêutica totalmente descabida para atacar a personalidade divina
(sobretudo a do Filho e a do Espírito Santo) ao declararem, sem base histórica
ou teológica, que o monoteísmo trinitário é uma heresia aceita no corpo
doutrinário da fé cristã.
A Trindade não pode ser explicada por
nossa filosofia ou teologia, da mesma forma que outros mistérios revelados como
a encarnação e a ressurreição. Acertadamente ponderou certo teólogo que “a
elaboração histórica da Trindade [...] busca circunscrever e proteger o
mistério (não explicá-lo; isso está além de nosso alcance), e nos confronta com
o que seja talvez o pensamento mais difícil com o qual a mente humana já teve
que lidar. Não é fácil; mas é verdadeiro”. Podemos, contudo, utilizando o
princípio tota scriptura (a
totalidade da Escritura), apreender essa doutrina mediante as inúmeras
evidências persuasivas emanadas do texto bíblico. Dessa maneira, à luz da
coerência interna da Bíblia, os que pensam diferentemente deveriam reconsiderar
sua posição para a qual não existe fundamento escriturístico algum. Se o
“retrato” de Deus apresentado nas Escrituras é o de um Ser essencialmente
relacional – manifestado em três Pessoas divinas e coeternas –, não existem
razões suficientes para questionar esse ensinamento.
Perante a revelação trinitária de
Deus, o filósofo americano Mortimer Adler refletiu: “Para mim, a Trindade não é
apenas uma resposta bonita; eu acredito que é a única explicação para a maior
busca dos filósofos e sua experiência.” E o teólogo Donald M. Baillie
arrematou: “A doutrina da Trindade faz-nos ver que Deus é ‘pessoal de modo
incompreensível’.” Creio que ser um cristão trinitariano é abraçar a própria fé
de Jesus, reconhecendo que o Pai, o Filho e o Espírito Santo têm toda a
plenitude da Divindade. Algo menos que isso significa diminuir a personalidade
divina e obscurecer a verdadeira e incomparável identidade de Elohim, o que
pode resultar em consequências negativas para a salvação do ser humano.
Ao se deparar com a visão do
Altíssimo, o profeta Isaías ficou extasiado e temeroso com Sua grandeza e
majestade. Contemplou serafins fazendo uma exclamação tríplice: “Santo, Santo,
Santo é o Senhor dos Exércitos!” (Isaías 6:3). Alguns veem nesse reconhecimento
angélico da santidade infinita de Deus mais um indício trinitariano de que
santo é o Pai, santo é o Filho e santo é o Espírito. Assim, por mais
inexplicável, espantosa e “estranha” que seja a visão do Deus triúno, faz
sentido tanto da perspectiva bíblica quanto filosófica aceitar que o alto e
sublime Criador é único sendo três. Se ninguém O explica, Ele próprio Se revela
na Palavra. Agora, se nós aceitamos ou rejeitamos Sua explicação revelada, essa
é outra história. O melhor caminho ainda é seguir a confissão de Agostinho:
“Creio para entender.”
(Frank de Souza Mangabeira, membro da Igreja Adventista do Bairro Siqueira Campos, Aracaju, SE; servidor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Sergipe)
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