
O fato de nesta semana eu estar aqui no Unasp cursando Arqueologia Bíblica com o meu orientador de mestrado, o Dr. Rodrigo Silva, veio a calhar. Falei com ele sobre esses achados e ele fez uma rápida pesquisa, chegando às seguintes conclusões, as quais resolvemos partilhar com você, leitor deste blog, e, quem sabe, ajudar a impedir que sejam espalhadas inverdades que apenas denigrem a reputação dos seguidores e pregadores da Bíblia:
1. A descoberta do Palácio de Davi é fato. O jornal Folha de S. Paulo, em sua edição de 06/08/05, traz a seguinte notícia: “Uma arqueóloga israelense diz ter descoberto em Jerusalém Oriental o lendário palácio do rei bíblico Davi... A descoberta é rara e importante: um grande edifício público do século 10 a.C., junto com fragmentos de cerâmica da época de Davi e Salomão e um sinete (usado para carimbar documentos) que pertenceu a um funcionário mencionado no livro do profeta Jeremias. A descoberta provavelmente vai se tornar mais um argumento numa das maiores controvérsias da arqueologia bíblica.”
2. Já as tais moedas com o rosto e o nome de José são, na verdade, um grande mal-entendido. A informação proveio do jornal egípcio Al-Ahram, via site Memri. Outro site que repercutiu o assunto foi o Urban Christian News. Este até publicou uma foto, dando uma tremenda “barrigada” jornalística. As moedas da imagem são, na verdade, gregas e trazem a inscrição “Basileos Ptolomaios”. Nada de hieróglifos. Detalhe: José viveu por volta do ano 1850 a.C., enquanto Ptolomeu viveu no terceiro século a.C.

4. José não era faraó. Como teria uma moeda esculpida com seu nome e rosto? (Além do que, por ser judeu, não consentiria como esse tipo de homenagem pictográfica.)
5. O Dr. Sa’id Mahammad Thabet, que é muçulmano, parece mais é querer provar a exatidão do Alcorão, que na Sura 12:20 diz que os irmãos de José o “venderam por um preço baixo, um número de moedas de prata”. Muito material do Alcorão é “emprestado” da Bíblia, que é bem mais antiga que o livro sagrado dos islâmicos. O que ocorre neste caso específico é uma corruptela da tradução mal feita do texto bíblico de Gênesis 37:38: “Passando, pois, os mercadores midianitas, os irmãos de José, alçando-o da cisterna, venderam-no por vinte ciclos de prata aos ismaelitas, os quais o levaram para o Egito” (Almeida Contemporânea). A versão Almeida Revista e Atualizada traz a palavra “moedas” em lugar de “ciclos”. Ocorre que o original hebraico traz apenas “vinte de prata”. A palavra shekels (= peças, pedaços, peso ou ciclos) foi um acréscimo posterior ao texto original. O Alcorão, baseado numa tradução bíblica imprecisa, colocou “moedas”.
6. O que Thabet faz é tentar “salvar” o texto corânico, indo na contramão de outros estudiosos, ao afirmar que há textos da 3ª, da 6ª e da 12ª dinastias que mencionam moedas. Só que ele usa a palavra deben, que, à semelhança de shekel, era também usada para se referir à medida de peso (como o futuro talento) e pesava 21 gramas.
Fica aqui, mais uma vez, a advertência para que não espalhemos informações imprecisas (e/ou até inverídicas) por aí. O leitor fez bem em me enviar o e-mail em busca de mais informações. Presta-se um grande desserviço quando se usam boatos infundados para tentar validar a Bíblia. Com isso, cristãos conseguem o efeito contrário e dão ainda mais munição para os críticos de plantão.[MB]
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