O
voo da empresa aérea Taca, número 0138, nos deixou – meu pai e eu – na cidade
de Guayaquil, Equador. Uma cidade enorme e movimentada, facilmente comparada a
qualquer capital do Brasil, mas em nada comparada com a ilha a 1.255 km de
distância, pertencente ao mesmo país e que era nosso destino. Passamos uma
noite em Guayaquil e nos preparamos, na manhã seguinte, para embarcar no avião
que nos deixaria na maior ilha das que compõem as Ilhas Galápagos: Isabela.
A
princípio, esse passeio era para ser exatamente isto: um passeio. Meu pai e eu
escolhemos esse lugar por ter sido fortemente recomendado pela minha prima que
havia passado um tempo lá. Porém, ao planejar a viagem, muitos me olharam
“torto”, e aqueles com um pouco mais de coragem para se manifestar de forma
audível perguntaram: “O que você vai fazer lá? Não foi lá que Darwin elaborou a
teoria da evolução?” Talvez alguns estivessem querendo dizer que a ilha exala
algum tipo de “poção mágica” capaz de fazer com que todos os seus visitantes se
convertam ao evolucionismo. Não sei, é apenas um palpite.
Por
isso, antes mesmo de ir, a viagem se transformou para mim em mais do que um
passeio; tornou-se uma “missão” – a missão de descobrir o que aqueles pequenos
pedaços de terra poderiam fazer com minha confiança no criacionismo.
O
Beagle, barco em que Charles Darwin fez sua excursão de cinco anos pelo mundo,
chegou no dia 15 de setembro de 1835 à Ilha de San Cristóbal, no território dos
Galápagos. Foi lá que ele viu a corroboração para sua teoria. Apesar de as ilhas
estarem muito próximas umas das outras, há diferenças significativas entre
muitas das espécies ali encontradas.
Minha
primeira impressão das ilhas foi um pouco diferente daquela que Darwin teve 177
anos antes. De acordo com o diário de bordo dele, “nada poderia ser menos
convidativo do que esse primeiro relance”. De acordo com ele, foi o solo todo
vulcânico que o desmotivou, talvez porque ele não fosse tão empolgado com águas
cristalinas como eu (o que consigo compreender levemente, imaginando o que se
passa com uma pessoa que fica cinco anos em um barco!). A vista do alto foi
perfeita, como se a chegada fosse no Caribe, só que melhor.
Na
chegada, que programa melhor do que visitar um museu? Sobre o quê? A evolução,
é claro. Não levo a mal, afinal, se você vai ao “paraíso evolutivo”, esteja
preparado pra ouvir MUITO as palavras Darwin e evolução. Tudo aquilo me
mantinha com a mente aberta para aprender e comparar as informações que eu
estava ouvindo e vendo com o que havia aprendido anteriormente. O pior tipo de
criacionista, em minha opinião, é aquele que rejeita qualquer comentário ou
ideia que não sejam aqueles que ele já pré-concebeu, e procura mostrar para o
mundo inteiro que os demais estão errados. Talvez por isso sejamos tão
rejeitados, academicamente falando.
A
partir do momento em que descemos do avião, percebi que aquele local tinha algo
para me oferecer que eu jamais havia visto em outro lugar. Na calçada: leões
marinhos (pra TUDO que é lado). Nas pedras: iguanas e pinguins (sim, pinguins
no Equador!). No mar: baleias, arraias, tartarugas e (sim, também) leões
marinhos. No ar: as aves mais lindas que você possa imaginar. Na terra:
tartarugas gigantes.
Sinceramente, me senti uma criança numa loja
de brinquedos. Parecia que o pescoço não era flexível o bastante para mexer a
cabeça em todas as direções, e a memória não era boa o bastante para gravar
todas as imagens mentais que eu tentava fazer.
Nas
três ilhas que visitamos, tínhamos um naturalista e um guia explicando cada
detalhe daquela utopia que estávamos tendo o privilégio de viver. Fiz amizade
com os três naturalistas e o guia se tornou um grande parceiro. Então, depois
de alguns dias, me senti na liberdade de começar uma conversa que eu sabia que
os deixaria extremamente desconfortáveis. A realidade é que não são apenas
biólogos fanaticamente evolucionistas, com um binóculo na mão direita e o A Origem das Espécies na mão esquerda,
que visitam as Ilhas Galápagos. A maioria dos turistas é... “gente normal”. E
provavelmente tão religiosa e criacionista quanto eu. Então, logo de cara, os
guias procuram se colocar em uma posição neutra e tentam se esquivar de
conversas que pendam para qualquer um dos lados; e, para falar a verdade, saí
sem saber qual era a verdadeira posição de qualquer um deles.
Enquanto
estávamos numa trilha pelo vulcão de Isabela e eu estava estrategicamente longe
do meu pai (evolucionista de carteirinha assinada), perguntei ao naturalista o
porquê de eles não mencionarem a diferença entre microevolução e macroevolução.
Recebi de volta uma expressão muito diferente da esperada. Apesar de os olhos
estarem cobertos pelos óculos escuros (um pouco exagerados para seu rosto
pequeno), não dava para negar que a expressão do guia foi de total confusão. “O
que é macro e microevolução?”, foi a pergunta dele. Dali em diante, toda vez
que parávamos para que algo fosse explicado com o pano de fundo da evolução,
uma voz irritante saía do meio do grupo: “Isso é microevolução!”, e eu
conseguia ver os olhos do meu pai rolando de vergonha para um lado e para o
outro.
Não
sou bióloga, naturalista, geóloga, nem faço parte de qualquer tipo área que me
dê credibilidade no interminável debate entre criacionismo e evolucionismo, mas
algumas coisas não precisam ser compreendidas com um diploma, e sim com a
simples lógica. O fato de uma espécie demonstrar significativas diferenças de
uma ilha para outra prova que somos seres amplamente adaptáveis (da mesma forma
que eu, tão clara quanto a protagonista da Branca de Neve e os Sete Anões, não consigo,
nem numa escala muito pequena, ficar levemente bronzeada na praia). Não que
essas modificações sejam exatamente uma “evolução” (no sentido como os
darwinistas entendem a palavra) e nem que possa se originar uma nova espécie a
partir dessas pequenas mudanças.
O
que pude experimentar durante aqueles dez dias ali naquelas ilhas, nunca poderá
ser explicado em palavras, nem mesmo em fotografias. Apesar de naquele dia 15
de setembro de 1835 Deus ter sido “apagado” da história da criação do mundo,
durante meus dias lá, o Deus Criador Se escancarou diante dos meus olhos, mais
do que nunca antes. E apesar de não estar com meu amado marido ao meu lado,
senti mais verdadeira a trilha sonora do nosso carro, quando colocamos Elvis
Presley cantando “How great Thou art”, ou, traduzido para o hino número 34 do
Hinário Adventista: “Quão grande és Tu”. Nesse hino, o autor escreve a seguinte
manifestação de reverência:
Senhor
meu Deus, quando eu, maravilhado, / Fico a pensar nas obras de Tuas mãos, / Estrelas
mil a cintilar no espaço, / De Teu poder, em manifestação.
Então
minh’alma canta a Ti, Senhor: / Quão grande és Tu! Quão grande és Tu! / Então
minh’alma canta a Ti, Senhor: / Quão grande és Tu! Quão grande és Tu!
Desculpe-me, Charles e todos os seus seguidores, mas, diante da beleza única das Ilhas Galápagos, essas são as únicas palavras merecedoras de saírem da minha boca.
Desculpe-me, Charles e todos os seus seguidores, mas, diante da beleza única das Ilhas Galápagos, essas são as únicas palavras merecedoras de saírem da minha boca.