quinta-feira, maio 01, 2008

Uma entrevista intrigante

O relato a seguir foi feito por Nair Elias dos Santos Ebling, professora da Faculdade de Ciências do Unasp e publicado em meu livro A História da Vida:

“Estava no último ano de meu curso na faculdade. Minha inclinação havia sido sempre por Genética e eu era monitora do Departamento de Citologia e Genética.

“O professor responsável pelo departamento realizava pesquisas com a Drosófila – essas pequenas moscas da fruta – e eu trabalhava com ele. Esse professor havia realizado estudos a respeito dos escritos do Dr. Theodosius Dobzhansky, nos Estados Unidos. Mais tarde, o Dr. Dobzhansky veio ao Brasil e foi então que tive a oportunidade de conversar com ele.

“A expectativa pela visita desse grande cientista era muito grande para todos os alunos da área de Biologia, porque seus livros e trabalhos científicos eram muito citados e contribuíam para formar nossa cosmovisão.

“Eu mesma estava no auge de minha crise existencial. Como adventista do sétimo dia, era criacionista. Porém, a Universidade, toda estruturada na teoria da evolução estava comprometendo os fundamentos de minha crença. Portanto, ao ter a oportunidade de conhecer pessoalmente o ‘papa’ do evolucionismo em genética era ao mesmo tempo excitante e atemorizador.

“No dia de sua chegada, fui convidada a almoçar com ele. Eu tive muito medo, mas ele era um velhinho simpático e falava bem o português. De repente, minha primeira surpresa: ofereceram-lhe suco de abacaxi e lhe perguntaram se ele queria natural ou com menta. Em um tom de voz que todos podiam ouvir, respondeu:

– Eu sempre prefiro as frutas com o sabor que o Criador colocou nelas!

“Todos riram, mas eu olhava atentamente a fim de descobrir se ele falava com certa ironia ou se falava sério. Em outras ocasiões também fez referências similares ao ‘Criador’ e, quando os outros riam, ele mostrava certa surpresa.

“Finalmente, em um passeio que fizemos para caçar moscas Drosófilas nas margens de um rio onde estávamos realizando uma pesquisa científica, tive a oportunidade de ter uma longa conversa com ele. Essa conversa ficaria marcada em minha vida e me firmaria no criacionismo.

“Detivemo-nos para almoçar em um restaurante típico ao lado do caminho junto ao rio. Servia-se uma variedade de frutas, verduras e legumes. Dobzhansky começou a servir-se. Nisso, aproximei-me. Gentilmente ofereceu-se a servir-me, enquanto dizia:

– O Criador não foi nada mesquinho com a variedade!

“Aproveitei a oportunidade para perguntar o que ele queria dizer quando se referia ao ‘Criador’. Ele colocou o dedo em frente aos lábios em sinal de ‘silêncio’ e me perguntou se eu gostaria de caminhar. Respondi afirmativamente e ele me fez um convite:

– Depois do almoço vamos fazer, então, uma caminhada.

“Terminei rapidamente meu almoço e ele fez o mesmo.

“A trilha por onde caminhamos apresentava grande variedade de flores silvestres. Arrancou uma delas e perguntou o que eu via através da flor. Disse-lhe que podia ver muitas coisas através dela: além da harmonia externa, podia reconhecer a estrutura interna; podia olhá-la pelo microscópio e ver muito mais, etc. Mas disse-lhe que, sem dúvida, ele podia ver muito mais que eu.

“Aqui é onde ele me fez a pergunta crucial:

– Tu crês realmente que tudo isso pode haver sido resultado do acaso? – ao que eu respondi:

– Não, eu não creio nisso; porém, professor, através de seus artigos e livros você tem conseguido me deixar confusa.

“Ele continuou me mostrando várias coisas da natureza e falando delas, desacreditando o acaso e o tempo como responsáveis por tudo.

“Minha surpresa diante de tudo isso era grande, e comecei a fazer-lhe uma série de perguntas: ‘Que é que o senhor busca? Aonde está querendo chegar? O senhor, que tem feito gerações de jovens crer na evolução e no acaso como os agentes de tudo através de milhões de anos, agora está dizendo o oposto?’

– Tu és criacionista – disse-me ele – continua sendo. Não mudes pelo que eu tenho dito ou escrito.

– Mas, professor – continuei – que farás com toda a influência que já tiveste e continuarás tendo?

“Aqui ele encerrou o assunto com uma declaração impressionante:

– Tu não necessitas transitar pelo caminho que segui. És muito jovem. Continua sendo criacionista. Eu já tenho ido demasiado longe e não tenho tempo para voltar atrás.”