Comumente
se acredita que a Idade Média, também conhecida como Idade Escura, foi uma
época de trevas e superstição, uma época em que houve pouco progresso no
conhecimento e na qualidade de vida. Os pensadores racionalistas dos séculos 17
e 18 rejeitaram aquela visão de mundo baseada no poder da Igreja e do rei.[1]
[2] Junto com o abuso de poder pela Igreja e pela Monarquia, porém, um grande
número deles rejeitou a religião e o Deus bíblico, acreditando que foram eles a
causa daquele tipo de mundo. Foi a religião da Idade Média fruto dos
ensinamentos bíblicos? Estava ela seguindo as instruções deixadas por Cristo e
os apóstolos? A Igreja Cristã fundada por Cristo e os apóstolos foi perseguida
em seu início pelos imperadores romanos. A mudança ocorreu quando o imperador
Constantino, aparentemente, se converteu ao Cristianismo.
“A
adesão de Constantino ao Cristianismo assegurou a exposição de todos os seus
súditos à religião e ele obteve não pouco domínio. Ele também estabeleceu o
domingo como um feriado romano oficial de modo que mais pessoas pudessem
comparecer à igreja e tornou as igrejas isentas de impostos. No entanto, muitas
das mesmas coisas que ajudaram o Cristianismo a se espalhar subtraíram dele seu
significado pessoal e promoveram corrupção e hipocrisia. Muitas pessoas eram
atraídas à Igreja por causa do dinheiro e das posições favoráveis que
Constantino disponibilizava para elas, ao invés do que pela piedade. [...]
Constantino acreditava que a Igreja e o Estado deviam ser tão íntimos quanto
possível. De 312 a 320, Constantino foi tolerante com o paganismo, mantendo
deuses pagãos nas moedas e retendo seu título pagão de sumo sacerdote,
‘Pontífice Máximo’, a fim de manter a popularidade com seus súditos, indicando
que possivelmente ele nunca entendeu a teologia do Cristianismo. De 320 a 330,
ele começou a atacar o paganismo por meio do governo, mas, em muitos casos,
persuadia o povo a seguir as leis combinando a adoração pagã com o
Cristianismo.”[3]
A
religião cristã manteve-se relativamente pura e fiel aos ensinamentos de Cristo
e dos apóstolos enquanto era perseguida, mas quando obteve o favor do Estado,
ela começou a fazer concessões em troca de favores. A pureza da mensagem foi
obliterada em favor da popularidade e do poder. A religião cristã absorveu
muito do paganismo.
O
cardeal Gibbons explica o que aconteceu com a Igreja nesse tempo: “Constantino
concedeu à Igreja Romana munificentes doações de dinheiro e estado real, os
quais aumentaram por subvenções adicionais de imperadores subsequentes.
Consequentemente, o patrimônio dos pontífices romanos logo se tornou bastante
considerável. [...] Um acontecimento que ocorreu no reinado de Constantino
pavimentou o caminho para a jurisdição parcial que os pontífices romanos
começaram a experimentar sobre Roma e que eles continuaram a exercer até que
obtiveram plena soberania nos dias do rei Pepino da França. No ano 327, o
imperador Constantino transferiu o trono do império de Roma para
Constantinopla, a atual capital da Turquia. [...] Abandonada a si mesma, Roma
se tornou uma presa tentadora para aquelas numerosas hordas de bárbaros do
Norte que então devastavam a Itália. [...] Sem poder obter auxílio do imperador
no leste ou do governador em Ravena, os cidadãos de Roma recorreram aos papas
como seus únicos governadores e protetores, e como sua única salvação dos
perigos que os ameaçavam. [...] ‘Em pouco tempo encontramos este colossal
império se despedaçando e a Cabeça da Igreja Católica dispensando leis para a
Cristandade na própria cidade na qual os césares imperiais haviam promulgado
seus editos contra o Cristianismo!’”[4]
A
Igreja obteve o favor do mundo. As profecias do Apocalipse revelam que a Igreja
desse período se corrompeu e se tornou “prostituta”, forma como a Bíblia
representa o povo de Deus quando este faz aliança com os poderes do mundo
(Apocalipse 17:1-6; Apocalipse 19:1, 2; Isaías 1:1, 4 e 21; Ezequiel 23:1-5 e
11; Oseias 1:1, 2). A mensagem e os mandamentos de Deus na Bíblia foram
misturados e, muitas vezes, modificados para se adaptar às tradições e à autoridade
humanas.
Diz
o cardeal Gibbons: “Uma regra de fé ou um competente guia para o Céu deve ser
capaz de instruir em todas as verdades necessárias para a salvação. No entanto
as Escrituras, somente, não contêm todas as verdades que um cristão é levado a
crer, nem prescrevem explicitamente todos os deveres que ele é obrigado a
praticar. Para não mencionar outros exemplos, não está cada cristão obrigado a
santificar o domingo e se abster nesse dia de desnecessária obra servil? Não
está a observância dessa lei entre os mais proeminentes de nossos deveres
sagrados? Mas você pode ler a Bíblia de Gênesis a Apocalipse e não encontrará
uma única linha autorizando a santificação do domingo. As Escrituras requerem a
observância religiosa do sábado, um dia que nós nunca santificamos. A Igreja
Católica corretamente ensina que nosso Senhor e Seus apóstolos inculcaram
certos deveres religiosos importantes que não foram registrados pelos
escritores inspirados. [...] Devemos, portanto, concluir que as Escrituras
sozinhas não podem ser um suficiente guia e regra de fé porque elas não podem,
em tempo nenhum, estar dentro do alcance de cada inquiridor; porque elas não
são por si mesmas claras e inteligíveis, mesmo em questões da mais alta
importância e porque elas não contêm todas as verdades necessárias para a
salvação.”[4]
E
ele prossegue afirmando o que é considerado seguro para a salvação das pessoas:
“A Igreja tem autoridade de Deus para ensinar a respeito da fé e moralidade, e
em seu ensino ela é preservada de erro pela especial guia do Espírito Santo. Essa
prerrogativa de infalibilidade é claramente deduzida dos atributos da Igreja já
mencionados. [...] Quando uma disputa surge na Igreja com relação ao sentido da
Escritura, o assunto é referido ao Papa para adjudicação final. O Soberano
Pontífice, antes de decidir o caso, reúne ao redor de si seus veneráveis
colegas, os cardeais da Igreja; ou ele convoca um conselho de seus juízes de fé
associados, os bispos da Cristandade; ou ele recorre a outras luzes que o
Espírito Santo possa sugerir-lhe. Então, após deliberação madura e com oração,
ele pronuncia juízo e sua sentença é final, irrevogável e infalível.”[4]
Contudo,
na Bíblia, é declarado inequivocamente que ela provê a sabedoria necessária
para a salvação, que nada deve ser acrescentado a ela e que se alguém falar
algo que não está de acordo com ela, essa pessoa não tem iluminação (direção do
Espírito Santo): “E que desde a infância sabes as sagradas letras, que podem
fazer-te sábio para a salvação, pela fé que há em Cristo Jesus. Toda Escritura
é divinamente inspirada e proveitosa para ensinar, para repreender, para
corrigir, para instruir em justiça; para que o homem de Deus seja perfeito, e
perfeitamente preparado para toda boa obra” (2 Timóteo 3:15-17).
“Toda
palavra de Deus é pura; Ele é um escudo para os que nEle confiam. Nada
acrescentes às Suas palavras, para que Ele não te repreenda e tu sejas achado
mentiroso” (Provérbios 30:5, 6).
“A
Lei e ao Testemunho! se eles não falarem segundo esta palavra é porque não têm
iluminação” (Isaías 8:20).
“Deixai-vos
pois do homem cujo fôlego está no seu nariz; porque em que se deve ele
estimar?” (Isaías 2:22).
E
Jesus falou claramente aos sacerdotes de Seu tempo quando eles instituíram
preceitos que não estavam nas Escrituras e que se opunham à lei que o próprio
Deus havia dado: “E vós, por que transgredis o mandamento de Deus por causa da
vossa tradição? Pois Deus ordenou: Honra a teu pai e a tua mãe; e, Quem
maldisser a seu pai ou a sua mãe, certamente morrerá. Mas vós dizeis: Qualquer
que disser a seu pai ou a sua mãe: O que poderias aproveitar de mim é oferta ao
Senhor; esse de modo algum terá de honrar a seu pai. E assim por causa da vossa
tradição invalidastes a palavra de Deus. Hipócritas! bem profetizou Isaías a
vosso respeito, dizendo: Este povo honra-Me com os lábios; o seu coração,
porém, está longe de Mim. Mas em vão Me adoram, ensinando doutrinas que são
preceitos de homem” (Mateus 15:3-9).
Os
racionalistas dos séculos 17 e 18 rejeitaram toda religião e o Deus cristão, e
idealizaram um mundo fundado sobre a razão humana que viveria um progresso
constante em meio a liberdade, igualdade e fraternidade. Eles imaginaram que a
causa para a opressão e a tirania estava na existência da religião e da monarquia.
Não perceberam que a causa para a corrupção está no coração humano que se
desviou de Deus no início da história da humanidade. De forma que o ser humano
pode se desviar de Deus e seguir seus impulsos dentro da religião ou fora dela.
Na prática, o resultado é o mesmo.
Os
pioneiros da Revolução Científica nunca viram oposição entre a Ciência e a Religião,
pelo contrário, era sua religião que os levava a apreciar melhor os fenômenos
da natureza. Copérnico foi um cônego da Igreja até o fim de sua vida e dedicou
sua obra De Revolutionibus Orbium Coelestium
ao papa Paulo III.[5] O caso de Galileu com a Igreja foi
mais uma questão política de desconsiderar a autoridade do Papa do que uma
controvérsia entre Ciência e Religião. Galileu nunca abandonou a religião até o
fim de sua vida.[6] Newton passou grande parte de sua existência estudando a Bíblia e suas profecias. Ele produziu uma
extensa obra sobre esses temas e a Universidade de Oxford disponibilizou seus
escritos religiosos em um site denominado The Newton Project.[7]
Giordano
Bruno é por muitos considerado um mártir da Ciência. Ele foi condenado pelo
tribunal da Inquisição e morreu queimado em 1600.[8] Contudo, ele foi mais um
filósofo do que cientista. Hilary Gatti escreveu que ele tinha uma “bem
conhecida e claramente expressa aversão pela nova matemática, que ele via como
uma abstração esquemática tentando aprisionar as vicissitudes vitais da matéria
em fórmulas estáticas de validade universal”.[9] E Alessandro G. Farinella
declara que, “com relação à doutrina de Bruno sobre conhecimento, os termos e as
referências que ele emprega se aproximam, na maior parte, especificamente, da
linguagem neoplatônica. O mundo é considerado como um todo dividido em uma
série de graus, que a tradição neoplatônica encapsulava na imagem da schala naturae, graus que estão
presentes nos processos e funções cognitivos. Bruno enfatiza que tais funções
são espontaneamente despertadas na alma quando a atenção do sujeito está livre
do peso e corporalidade do conhecimento sensorial.”[10]
A
Catholic Encyclopedia afirma o
seguinte sobre o motivo de sua condenação pela Inquisição: “Bruno não foi
condenado por sua defesa do sistema copernicano de astronomia, nem por sua
doutrina da pluralidade de mundos habitados, mas por seus erros teológicos que
eram os seguintes: que Cristo não era Deus, mas meramente um pouco comum mágico
habilidoso, que o Espírito Santo é a alma do mundo, que o Diabo será salvo,
etc.”[11]
A
Encyclopaedia Britannica, como
mencionado anteriormente, declara que a descoberta de Newton do Cálculo
alavancou o desenvolvimento de todas as ciências e tecnologias atuais. O estudo
das leis básicas da Física depende do Cálculo, assim como as da Química, da
Biologia e de outras áreas de conhecimento da natureza.
É
comum que pessoas que lidam com diferentes áreas de estudo da natureza não
tenham consciência plena das leis que regem os fenômenos básicos com os quais
elas lidam diariamente, pois, normalmente, usam aplicações dessas leis sem
pensar expressamente sobre isso. Basta pensar que a descoberta do Cálculo tornou
possível a dedução de relações que geram fórmulas usadas em diversas áreas e
que levaram ao desenvolvimento dos microscópios eletrônico e de tunelamento,
entre outros; os exames de tomografia, ressonância magnética e
ultrassonografia; os equipamentos de laboratório; a exploração do espaço; os
computadores e a internet, os celulares; enfim, tudo o que facilita as
pesquisas e produz os confortos modernos.
Além
disso, é bastante comum o pensamento de que a Relatividade e a Mecânica
Quântica invalidaram as leis de Newton quando se consideram velocidades
próximas à da luz, campos gravitacionais muito intensos ou fenômenos
microscópicos. O que ocorreu, na verdade, foi que essas novas teorias podem ser
entendidas como especializações da Mecânica de Newton, pois coincidem com ela
acrescida de postulados que tornam o sistema mais específico. O que se fazia
anteriormente com as leis de Newton era acrescentar-lhes postulados
implicitamente, postulados esses baseados apenas em noções filosóficas que não
faziam parte da teoria newtoniana em si, tais como a ideia de que o tempo é
absoluto e de que as grandezas físicas podem ser bem representadas por números.
A Relatividade e a Mecânica Quântica apenas contradizem esses conceitos extras,
não a Mecânica de Newton em si.
Notemos,
portanto, que enquanto os filósofos racionalistas idealizavam um mundo de
progresso fundado na razão humana e na liberdade à parte de Deus, o homem, que
com sua descoberta do Cálculo foi o principal responsável pelas maravilhas do
mundo moderno, passou grande parte do seu tempo entre o estudo da Bíblia e da
natureza. As duas revelações de Deus foram estudadas diligentemente por ele e
isso o habilitou a transformar o mundo!
(Graça Lütz é bióloga e bioquímica)
Referências:
[1]
ENCYCLOPEDIA, N. W. Age of enlightenment. http://www.newworldencyclopedia.org/entry/Age_of_Enlightenment
[2] OF PHILOSOPHY, S. E.
Enlightenment. https://plato.stanford.edu/entries/enlightenment/
20 8 2010
[3]
GRIESMER, J., B., P., MCCARTY, E., MOSBO, E. M., FERGUSON, C., GRUPP, A. N.
Constantine converts to christianity. http://www.thenagain.info/WebChron/EastEurope/ConstantineConverts.html
[4] GIBBONS, J. C. The faith
of our fathers. John Murphy Company Publishers, 1917.
[5]
Nicolaus copernicus biography.com. http://www.biography.com/people/nicolaus-copernicus-
[6]
FERGUSON, K. Historical notes: Galileo insulted the pope, not the church. http://www.independent.co.uk/news/people/historical-notes-galileo-insulted-the-pope-not-the-church-1084369.html
31 3 1999
[7] ILIFFE, R., MANDELBROTE,
S. The newton project. http://www.newtonproject.ox.ac.uk/texts/newtons-works/religious
[8]
AQUILECCHIA, G. Giordano bruno italian philosopher. https://global.britannica.com/biography/Giordano-Bruno
22 12 2016
[9]
GATTI, H. Giordano bruno and renaissance science. Cornell University Press,
2002.
[10]
FARINELLA, A. G. Giordano bruno: Neoplatonism and the wheel of memory in the de
umbris idearum. Renaissance Quarterly, v. 55, p. 596-624, 2002.
[11]
ENCYCLOPEDIA, C. Giordano bruno. http://www.newadvent.org/cathen/03016a.htm