O tema foi capa da Vida e Saúde deste mês |
Um novo caminho para
as pesquisas baseadas em design?
Em
relação à hipótese lamarckiana sobre a herança de caracteres adquiridos, Darwin
rejeitou inicialmente essa ideia, mas, devido às críticas contra a seleção
natural, ele a incorporou na sexta e última edição de A Origem das Espécies (1872), considerando-a um mecanismo de
adaptação ao ambiente (portanto, secundário no processo de evolução).[1] Aliás,
Darwin já havia tentado explicar em sua obra The Variation of Animals and Plants Under Domestication (1868), de
forma muito infeliz, a hereditariedade dos caracteres (inclusive dos
adquiridos) por meio das hipóteses da pangênese e das gêmulas.[2] Mas, ao longo
do tempo, os darwinistas ridicularizaram essa ideia e, com os avanços da
ciência, principalmente da Genética, os neodarwinistas a excluíram
definitivamente.[3] Nos
últimos anos, porém, alguns aspectos da ideia lamarckiana de herança de
caracteres adquiridos (que, a propósito, não é original de Lamarck) parecem ter
voltado à tona na Biologia por meio da Epigenética e da Transferência Horizontal
de Genes (THG).[4-6] A Epigenética diz respeito à alteração herdável na
expressão gênica, sem que haja mudança na sequência primária de DNA, sendo a
metilação do DNA e a modificação de histonas importantes mecanismos envolvidos.[7]
Trata-se de um campo de estudo emergente cujas implicações poderiam questionar
a validade do dogma central da biologia molecular. A THG, por sua vez, é um processo
pelo qual ocorre troca de material genético entre espécies não relacionadas
(plantas e animais) que vivem em um mesmo ambiente.
Para
Junior Eskelsen, coordenador do portal TDI Brasil, “a THG é uma explicação ad hoc para vários casos em seres multicelulares,
e o lamarckismo volta a ganhar força com ela. Em um ser multicelular, um código
que passa por THG para seguir verticalmente deve entrar no núcleo celular e ser
integrado em estágios embrionários ou algo parecido, assim será distribuído no
desenvolvimento do indivíduo. Isso porque deve participar da produção de
gametas, de alguma forma”.
Em
2015, um estudo experimental observou pela primeira vez um mecanismo para a herança
de características adquiridos, em lombrigas Caenorhabditis
elegans.[8] Esse mecanismo pode ter sido limitado em seu objeto de estudo,
no entanto, eles mostraram que isso acontece. Desde que a Epigenética entrou
para o vocabulário, mais geneticistas conservadores tiveram de recuar do dogma
central (DNA faz RNA que faz proteína) em graus variados. Nos dias de hoje, é
comum ver admissões de herança epigenética e transferência horizontal de genes.
Nesse
estudo, os autores mostraram que algumas mudanças ambientais podem causar
efeitos que duram algumas gerações – aliás, esses efeitos podem ser revertidos
em gerações futuras –, sem quaisquer mutações que alterem a informação no DNA.[8]
Os pesquisadores descobriram um agente de transferência de informação na forma
de RNA de fita dupla (dsRNA). É a primeira vez que esse processo é observado afetando
a linhagem germinativa. Segundo eles, os neurônios podem transportar formas de
dsRNA na linha germinativa para provocar o silenciamento de um gene que pode
durar até 25 gerações. Isso parece um mecanismo destinado a ajudar as gerações
seguintes a se adaptar às mudanças ambientais, e a se tornar mais longevas. É
certo que isso é bom para as lombrigas. O que dizer, então, dos organismos
superiores?
Os
autores consideram a possibilidade de que um mecanismo similar de importação de
dsRNA funciona em mamíferos.[8] Esse achado pode enfraquecer o neodarwinismo
clássico.[3] Se confirmado, não há mais esperança de mutações benéficas por
acaso; em vez disso, haverá sistemas organizados e sofisticados para a
transferência de informação persistente – sem a ajuda da seleção natural – a
partir do ambiente para o organismo e sua descendência, de modo que possa se
adaptar a uma mudança.[9, 10] Um novo nível de organização é linguagem de design. Isso soa como um plano
pré-programado em um mundo de mudança: um plano para manter a população estável
quando há ameaça de fome, seca, calor, frio, ou outros fatores.[9, 10] O que é
intrigante é esse nível de organização que os biólogos não sabiam que existia
em animais. Caso se confirme, aqui está um novo caminho em que a pesquisa
baseada em design pode assumir a
liderança.[3]
Portanto,
já podemos deduzir que Lamarck estava parcialmente correto? Seria
demasiadamente precipitado. Isso porque ainda existe uma posição contrária à
equiparação da Epigenética com a transmissão de características adquiridas.[6, 11]
Por outro lado, também existem múltiplas evidências que fortalecem a ideia de a
Epigenética ser lamarckiana.[12-19] Logo, devemos continuar sendo imparciais,
pois essa questão ainda está em debate. São necessários mais estudos
aprofundados sobre o tema antes de anularmos completamente a possibilidade ou
de afirmarmos categoricamente a volta da ideia lamarckista.
Mas
que a verdade seja dita! Conforme divulgou o pesquisador e historiador da
ciência Enézio Eugênio de Almeida Filho: “a Nomenklatura científica já está
elaborando uma nova teoria geral da evolução que, para desespero de Darwin e
discípulos, não será selecionista, mas incorporará aspectos neo-lamarckistas –
a Síntese Evolutiva Ampliada ou Estendida”, que será lançada em 2020.[20,
21]
(Everton Alves)
Referências:
[1]
Frezzatti Júnior WA. “A construção da oposição entre Lamarck e Darwin e a
vinculação de Nietzsche ao eugenismo.” Scientiae
Studia 2011; 9(4):791-820. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ss/v9n4/a04.pdf
[2] Darwin CR. The variation of animals and plants under
domestication. Vol. 2. London: John Murray, 1868.
Disponível em: http://darwin-online.org.uk/converted/published/1868_Variation_F877/1868_Variation_F877.2.html
[3] O’Leary D. “Epigenetic
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(25 Aug. 2015). Disponível em: http://www.evolutionnews.org/2015/08/epigenetic_chan098671.html
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[21] Mazur S. The Altenberg 16: An Exposé of the Evolution
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