Ao
definir que os Estados Unidos têm a meta de mapear o cérebro humano ativo, o
presidente Obama pode ter escolhido um desafio ainda mais difícil do que
encerrar a guerra no Afeganistão. Em mais de um século de pesquisas sobre as
células interligadas que compõem o cérebro, conhecidas como neurônios,
cientistas reconhecem que estão apenas começando a arranhar a superfície de um
desafio que será muito mais complexo do que o sequenciamento do genoma humano.
A administração Obama em breve irá anunciar a intenção de juntar as peças - e
as verbas - para um projeto de pesquisa, previsto para durar uma década, que
terá a meta de montar um mapa abrangente da atividade cerebral. Antes de os
cientistas poderem começar a traçar o mapa da atividade cerebral, eles precisam
desenvolver as ferramentas para o estudo do cérebro. E, antes de desenvolverem
ferramentas que funcionem com humanos, precisam conseguir fazê-lo com espécies
mais simples - supondo que aquilo que aprenderem poderá ser aplicado a humanos.
Além
dos desafios tecnológicos, há questões que envolvem o armazenamento das
informações colhidas por pesquisadores e questões éticas sobre o que poderá ser
feito com os dados. Muitos neurocientistas são céticos quanto às possibilidades
de êxito de um esforço para abrir a chave dos enigmas do cérebro.
“Acredito
que o paradigma científico subjacente a esse projeto de mapeamento é
desatualizado, na melhor das hipóteses. Na pior, é simplesmente equivocado”,
disse Donald G. Stein, neurologista da Escola de Medicina da Universidade
Emory, em Atlanta. “A busca por um mapa de caminhos neurais estáveis que possam
representar funções cerebrais é inútil.”
A
meta das pesquisas com animais é obter amostras de aproximadamente mil
neurônios simultaneamente. O cérebro humano possui entre 85 bilhões e 100
bilhões de neurônios. “Precisamos desenvolver novas técnicas, algumas delas a
partir do zero”, disse Rafael Yuste, neurocientista da Universidade Columbia,
em Nova York, pioneiro no uso de lasers para medir a atividade de neurônios no
córtex de camundongos.
Um
artigo publicado no ano passado no periódico Neuron descreveu um caminho possível para o mapeamento do cérebro
humano ativo. Assinado por seis cientistas destacados, o artigo propõe que o
projeto comece com espécies cujos cérebros tenham um número muito pequeno de
neurônios, passando em seguida para animais progressivamente mais complexos.
Os
cientistas citaram o verme C. elegans,
que até hoje é o único animal do qual existe um mapa estático completo, ou “connectome”.
Esse verme possui apenas 302 neurônios com 7.000 conexões. Os autores propõem
estudar a seguir a mosca drosófila, que possui 135 mil neurônios, o
peixe-zebra, com aproximadamente um milhão de neurônios, o camundongo e o
musaranho-pigmeu, o menor mamífero conhecido, cujo córtex é composto de
aproximadamente um milhão de neurônios.
Mas o salto para o
cérebro humano é tão enorme que o neurocientista Terry Sejnowski, do Instituto
Salk, descreveu o desafio como “a marcha de um milhão de neurônios”.
Os
pesquisadores já propuseram várias tecnologias que podem ser aplicadas, mas
muitas delas ainda são protótipos ou apenas especulativas. Algumas, como os
nanorrobôs que estão sendo projetados em lugares como o laboratório do
Instituto Wyss da Universidade Harvard, aparentam ter saído diretamente da
ficção.
As
tecnologias empregadas hoje para mapear a atividade cerebral em alta resolução
exigem a abertura do crânio, limitando drasticamente o que é possível fazer.
Os
cientistas reconhecem o desafio de capturar a quantidade de informação gerada
por neurônios. Num encontro em janeiro, cientistas concluíram que seriam necessários três
petabytes de capacidade de armazenamento para a informação gerada por apenas um
milhão de neurônios em um ano. O
Grande Colisor de Hádrons, em Genebra, gera cerca de dez petabytes de dados
anualmente. Se o cérebro contém 100 bilhões de neurônios, isso significa que o
cérebro completo gera cerca de 300 mil petabytes de dados a cada ano.