Repórter:
Vocês são sempre lembrados por “Ana Julia”, né?
Amarante:
Nem sempre.
Repórter:
Te incomoda ser sempre lembrado por “Ana Julia”?
Amarante:
Não, porque nem sempre.
Repórter:
Porque sempre quando tem “Ana Julia”, tem referência: “Los Hermanos, Ana Julia”...
Amarante:
Hã?
Repórter:
Sempre tem essa relação, “Ana Julia, Los Hermanos”...
Amarante:
Ah, é uma música nossa, né? Por isso tem relação... Você queria saber o que
mesmo?
Repórter:
Se incomoda vocês serem sempre lembrados por “Ana Julia”.
Amarante:
Não, porque não é sempre que a gente é lembrado por “Ana Julia”. Você vai ver,
hoje a gente não vai tocar “Ana Julia”.
Repórter:
Mas sempre a galera pede.
Amarante:
Não.
Repórter:
Não pede?
Amarante:
Não... Você já foi no show do Los
Hermanos?
Repórter:
Não.
Amarante:
Ah... e esse “sempre” vem da onde?
Repórter:
Do que eu li.
Amarante:
Ah...
Repórter:
Então, pelo jeito, incomoda!
Amarante:
Não. O que incomoda é o jornalismo - como é que eu vou dizer? - preguiçoso,
assim, de não saber o que perguntar, e perguntar qualquer coisa. “Ah,
incomoda...?”, um Jornalismo baseado na polêmica, sabe? É muito comum hoje em
dia a polêmica ser a tônica do jornalismo. Eu, particularmente, acho que o
trabalho do jornalista é muito importante, é assim, como o trabalho de uma
pessoa pública, do governo, do Estado. Tem uma responsabilidade, um papel
importante. As pessoas leem ou ouvem o que vocês fazem e tomam como verdade,
como uma coisa feita com critério. E isso influencia a opinião das pessoas por
aí. Então, esse tipo de pergunta assim, leviana, sem uma profundidade, acaba
levando as pessoas a terem uma impressão errada, que é essa, de que incomoda a
gente a “Ana Julia”. Pelo contrário: a gente adora a música, tem tocado em
muitos festivais e nunca tivemos problemas com isso. Só que é comum as pessoas
acharem que fazer sucesso é uma coisa ruim, negativa. Porque “ah, não, se faz
sucesso então não deve ser bom”. E isso é uma ingenuidade, tanto da imprensa,
quanto das pessoas, de achar que se tornar público ou ser muito conhecido é uma
coisa ruim. Acho que é ruim para quem é fraco e tem medo de perder isso. A
gente nunca teve isso. A gente faz música com o coração, da forma como a gente
sabe fazer. Então, “Ana Julia” foi feita da mesma forma, a gente adora a
música. As pessoas se incomodam é com a gente ter feito sucesso, isso sim.
Repórter:
Minha pergunta é assim... não é nada contra, nunca assisti o show, mas é pelo fato de eu já ter lido
sobre isso.
Amarante:
Eu acho que você leu... pouco. Desculpa a sinceridade.
Nota:
Não “curto” o estilo de música dessa banda, mas gostei muito da resposta do
cantor ao repórter superficial. Essa entrevista, realizada em uma coletiva de
imprensa no Festival de Inverno de Vitória da Conquista, é ilustrativa de
outros tipos de cobertura, como a da controvérsia entre criacionismo e
evolucionismo, por exemplo, em que os repórteres e editores deixam claros seus
preconceitos, não leem o suficiente e não fazem as perguntas certas. [MB]